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O desafio continua
 
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10/05/2009

O desafio continua



Até que ela recebeu o Prêmio Nobel de Medicina ou Fisiologia em 2008, muitos desconheciam que esta virologista do Instituto Pasteur de Paris foi a principal artífice da descoberta do vírus da Aids e a primeira signatária do artigo em que a equipe de Luc Montagnier comunicou a descoberta, em 1983.

Em sua recente visita a Bilbao (Espanha), a convite da Fundação BBVA, Françoise Barré-Sinoussi (nascida em Paris em 1947) reconhece que o HIV é provavelmente o vírus mais conhecido, mas que falta muito para se alcançar uma vacina ou um tratamento eficaz. O desafio continua sendo, segundo ela, estender os atuais tratamentos a todos os afetados e não baixar a guarda na prevenção com o preservativo. E, como novidade, anuncia que em um futuro próximo poderá haver anticoncepcionais reforçados com medicamentos antirretrovirais.

El País - A pesquisa sobre vacinas parece estar em um ponto morto. Por quê?
Françoise Barré-Sinoussi - Por que nos últimos 20 anos todas as potenciais vacinas foram um fracasso. Continuamos sem vacina e muita gente acredita que nunca haverá.

EP - É o que a senhora pensa?
Barré-Sinoussi - Não. Estamos aprendendo com os erros e já temos uma longa lista de obstáculos. Agora cabe estudá-los para tentar resolvê-los. Com o último fracasso, o da Merck [o teste Step foi suspenso em 2008 por falta de eficácia], percebemos que é preciso voltar à ciência básica, porque não sabemos ainda que tipo de resposta protetora queremos provocar com uma vacina. Provavelmente teríamos de proteger contra os sinais ou ordens patogênicas que o vírus provoca nas células imunitárias.

EP - As primeiras horas de exposição parecem cruciais.
Barré-Sinoussi - Sim. Essa é uma das prioridades da pesquisa internacional: entender como é esse primeiro evento em que o vírus é capaz de modificar as coisas.

EP - A senhora diz com frequência que o HIV é provavelmente o vírus mais conhecido, mas parece que ainda não é o bastante.
Barré-Sinoussi - O vírus é bem conhecido. O que não se conhecem são suas interações com as células defensivas, as da mucosa genital, as dos gânglios linfáticos, as do estômago...

EP - Além disso o HIV é muito variável. Tanto quanto o da gripe?
Barré-Sinoussi - Sim e não, porque não são comparáveis. Não podemos sequer estimar quantas variações tem. Milhares. Mas muito pequenas. Em um indivíduo, podem ser cem variações, em outro 10 mil.

EP - Esse é o grande problema?
Barré-Sinoussi - É um problema, mas não o principal. É muito fácil dizer que não temos uma vacina porque é um vírus muito mutável, mas as pessoas sabem que existe vacina contra a gripe, mesmo que tenhamos de modificá-la todos os anos. Se fôssemos capazes de fazer uma vacina contra uma variante única do HIV, poderíamos conseguir proteção contra todas as demais. O HIV é uma ferramenta fantástica para entender melhor como desenvolver vacinas para o futuro, não só contra o HIV, mas também para a malária e outras doenças, talvez inclusive contra o câncer.

EP - A senhora transmite a sensação de que haverá uma vacina.
Barré-Sinoussi - Sou uma cientista, e se não acreditasse na ciência deveria parar de trabalhar nisso.

EP - Estamos no início, no final ou na metade do caminho?
Barré-Sinoussi - Creio que estamos em um novo começo, ou melhor, temos uma nova agenda científica. Depois do fracasso do último teste clínico com uma vacina preventiva, a comunidade científica se deu conta de que resta um longo caminho e muito a fazer, com um enfoque multidisciplinar e integrador. Se pensarmos nas vacinas que protegem contra a evolução da infecção até a doença, estamos bastante seguros de que isso é possível.

EP - Por quê?
Barré-Sinoussi - Porque há uma pequena porcentagem de infectados, menos de 1%, que não desenvolvem a Aids. São os chamados "HIV controllers". Alguns estão há dez ou 15 anos infectados e não receberam tratamento antirretroviral.

EP - O tratamento certo depois da exposição parece ser muito eficaz. É possível imaginar para a Aids algo semelhante à "pílula do dia seguinte"?
Barré-Sinoussi - É uma possibilidade. Mas no que eu realmente acredito é na profilaxia com antirretrovirais antes da exposição. Os anticoncepcionais com antirretrovirais são realmente o próximo passo, o futuro para onde se deve ir. Há dados preliminares que indicam que é possível esse tipo de profilaxia em geleias de uso vaginal, e poderiam ser colocados antirretrovirais em diafragmas e outros anticoncepcionais.

EP - Cem por cento eficaz?
Barré-Sinoussi - Não estou dizendo isso. São dados preliminares, de laboratório, de modelos animais e de um estudo em fase 1 em humanos. A mensagem é que sabemos que as camisinhas protegem contra a infecção e a circuncisão em 50%, mas associada com a camisinha funciona perfeitamente. E o próximo passo será acrescentar antirretrovirais aos anticoncepcionais.

EP - Em que casos?
Barré-Sinoussi - Por exemplo, quando o homem não quer utilizar preservativo e para a mulher, em alguns países, é muito difícil dizer não a seu marido, mesmo que saiba ou suspeite que é soropositivo. Se tivesse esse gel com antirretrovirais estaria protegida.

EP - A infecção pelo HIV deveria ser de declaração obrigatória?
Barré-Sinoussi - Não podemos fazer uma recomendação universal porque há estigmatização demais dos infectados, inclusive na Europa e nos EUA. Antes de tomar essa decisão devemos lutar contra essa discriminação, que não é aceitável. Mas devemos melhorar a informação e a educação para que as pessoas que possam estar infectadas façam o teste voluntariamente o quanto antes, para seu próprio bem e o da comunidade.

EP - Se a senhora pudesse saber algo da biologia da Aids que hoje se ignora, o que gostaria de saber?
Barré-Sinoussi - Gostaria de saber mais sobre o fragmento do vírus que altera o sistema imunológico.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves


Autor: Gonzalo Casino, do jornal EL País
Fonte: UOL Jornais Internacionais

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