Médicos e transplantados vem alertando para uma questão perturbadora: a atual carência de doadores de fígado no Brasil. Nos últimos anos, o país vem contando com um número muito abaixo do ideal para suprir a demanda. De acordo com o gastroenterologista Wellington Andraus, apenas 35% dos transplantes de fígado necessários são feitos no país.
— Apenas um terço dos transplantes são efetuados, os outros, 65% das pessoas que precisam deste procedimento morrem na fila— lamenta o médico.
A situação é ainda mais grave em São Paulo, onde há maior fila de pacientes na lista de espera do país, em números relativos e absolutos. Segundo Andraus, o problema é multifatorial, como a falta de serviços de saúde em regiões pobres do país e a precariedade em alguns hospitais.
Tipos de transplante
Existem duas modalidades possíveis para transplante hepático: doadores falecidos por morte encefálica e intervivos (família ou aparentados compatíveis que doam para o paciente com fígado doente). O médico explica que o ideal é que a segunda alternativa não seja necessária, evitando risco cirúrgico para as pessoas saudáveis.
— A estimativa é de que ocorram 50 a 60 mortes encefálicas por milhão de habitantes a cada ano. Se conseguíssemos 25, já estaríamos atendendo às nossas necessidades. Praticamente nenhum país tem autossuficiência em doadores, só que aqui essa relação está muito pior— afirma.
Apesar dos esforços do Ministério da Saúde para descentralizar a captação dos órgãos e treinar cirurgiões, um dos gargalos é a falta de campanhas dentro da própria área de saúde para que os médicos e enfermeiros notifiquem potenciais doadores.
— A espera é muito angustiante. Assim como eu, havia várias pessoas no ambulatório à espera de transplante. Quando um deles falecia era um baque para todos os outros, a gente se perguntava se conseguiria chegar a nossa vez. É uma fase de bastante insegurança, mas não temos alternativa senão aguardar— comenta a colaboradora da Associação Brasileira dos Transplantados de Fígado e Portadores de Doenças Hepáticas (Transpática), Andrea Teixeira Soares.
Importância da conscientização
Não basta campanhas pontuais em épocas como a semana de doação de órgãos em setembro. São necessárias mobilizações constantes que esclareçam às famílias como é o processo de doação e explicar que a morte encefálica é irreversível.
— Muitas famílias recusam-se a doar os órgãos do parente morto por não compreenderem o que é morte cerebral e acreditarem que enquanto o coração bater a pessoa continuará viva e irá se recuperar— diz Andrea.
Os problemas mais comuns com o fígado que acabam gerando a necessidade do transplante no Brasil são ocasionados predominantemente pelo vírus C, responsável por alto índice de cirrose, além do álcool, hepatites autoimunes e gordura no fígado.