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Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade apresenta sintomas diferentes entre os adultos
 
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12/01/2015

Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade apresenta sintomas diferentes entre os adultos

Doença tem ganhado atenção de pesquisadores ao redor do mundo pelos efeitos e problemas que pode causar na vida adulta

Tem aquele amigo que não consegue prestar atenção na conversa por muito tempo. E outro que sempre se esquece dos prazos de entrega no escritório. Aquela prima que nunca é bem sucedida quando o assunto é namorar, e também a colega de trabalho que está sempre balançando os pés e as mãos, mesmo quando deve ficar parada. Todo mundo conhece alguém assim, não? Ainda que possam parecer meras características — muitas vezes atribuídas à preguiça, à ansiedade ou à falta de interesse —, elas podem representar um problema que vai além dos traços de personalidade. É o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), um distúrbio neuropsiquiátrico que, durante muitos anos, foi estudado e diagnosticado primordialmente em crianças, mas que cada vez mais tem ganhado a atenção de pesquisadores ao redor do mundo pelos efeitos e problemas que pode causar na vida adulta.

Conforme dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que o transtorno atinja em torno de 4% a 5% das crianças mundialmente. Destas, já se sabe que uma média de 50% mantém a doença na vida adulta, explica o psiquiatra Eugenio Grevet, chefe do Ambulatório de Déficit de Atenção em Adultos do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e professor da Faculdade de Medicina da UFRGS.

A dificuldade de se focar em tarefas cotidianas foi o sintoma que mais atrapalhou o engenheiro de sistemas Cleber Ferrari durante quase três décadas. Diagnosticado com TDAH aos 31 anos, ele lembra que descobrir a doença significou mais um alívio do que uma preocupação, já que a dificuldade de concentração fazia de um hábito relativamente simples, o da leitura, uma tarefa quase impossível em sua vida.

— Quando tinha um livro nas mãos, ficava pensando em três ou quatro coisas enquanto passava os olhos nas páginas. Às vezes, até esquecia que estava lendo, de tão longe que minha cabeça ia.

Hoje, aos 34 anos, Cleber relembra que as fases do colégio e da faculdade não foram fáceis. Foi por ter um QI acima da média, conforme avaliação psicológica, que conseguiu vencer os estudos sem atrasos. Mas, em outros aspectos, foi ficando para trás:

— Eu era muito irritado, inquieto. Não conseguia absorver direito as informações, nem interpretá-las. Sentia que tudo tinha que ser imediato, e isso me prejudicou bastante socialmente.

Histórico é primordial

Ao buscar a avaliação de um especialista, um dos critérios que ajudaram Cleber no diagnóstico foram suas recordações de infância. O engenheiro relembra que, entre as frases mais evocadas por sua mãe quando criança estavam "para!", "senta, te acalma!" e "desacelera e te concentra". Com o passar do tempo e a chegada da adolescência, a agitação externa diminuiu, mas a interna só aumentou.

O psiquiatra Grevet explica que, para um correto diagnóstico da doença, o paciente precisa manifestar pelo menos alguns sintomas desde a infância. Nessa fase, os portadores podem apresentar, basicamente, três espectros mais evidentes. O primeiro, em que predomina a hiperatividade; o segundo, a desatenção; e o terceiro, uma combinação de ambos. Durante muito tempo, acreditou-se que eles desapareciam espontaneamente ao final da adolescência, e por isso os tratamentos, quando realizados, não eram continuados. De fato, existe uma tendência de os sintomas da hiperatividade declinarem, explica o psiquiatra, já que os adultos aprendem a "domesticar" os comportamentos mais impulsivos e hiperativos. As descobertas mais recentes dão conta que, em muitos casos, a desatenção tende a persistir, pode se agravar e acaba trazendo inúmeros prejuízos à vida dos portadores.

— O TDAH é uma doença que tem um forte componente genético. O que se sabe hoje é que, quanto maior a participação genética no paciente, ou seja, quanto mais ele têm um histórico familiar da doença, maiores são as chances de o transtorno persistir na vida adulta — explica o psiquiatra Paulo Mattos, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (Idor).

Para não confundir

Mas isso não quer dizer que todos adultos inquietos ou desatentos sejam portadores de TDAH. O diagnóstico da doença é bastante complexo e leva em consideração diferentes aspectos comportamentais do paciente. Principalmente, o surgimento dos sintomas durante a infância.

— Muitas pessoas sofrem por serem desatentas, mas isso não quer dizer necessariamente que tenham TDAH. Quem dorme mal ou tem o hábito de beber álcool antes de dormir, por exemplo, pode ter prejuízos no dia seguinte, como ficar mais desatento. O transtorno, entretanto, é caracterizado quando, entre outras coisas, acarreta prejuízos significativos em atividades e relacionamentos cotidianos por um longo período — explica Grevet.

Pesquisas recentes indicaram que adultos com o distúrbio apresentam mais problemas conjugais, enfrentam dificuldades profissionais, demissões frequentes e trocas mais repetidas de emprego. Isso porque portadores de TDAH que mantêm a doença após a adolescência têm de fazer um grande esforço para se aproximarem das expectativas da sociedade em relação a um adulto, e normalmente falham. Eles esquecem compromissos, falam coisas sem pensar, não lembram de pagar as contas, não prestam atenção no trabalho. Essas falhas, quando não diagnosticadas e tratadas, acabam gerando frustração, baixa autoestima e outros transtornos psiquiátricos mais graves.

— A principal queixa destes adultos quando procuram o médico é, sem dúvidas, quanto à memória. Reclamam que não guardam informações, são rotulados equivocadamente de preguiçosos. Além disso, têm dificuldade para organizar seu ambiente de trabalho e vida pessoal, assim como priorizar tarefas mais importantes. Finalmente, podem apresentar problemas para resolver questões corriqueiras como planejar uma viagem de lazer ou organizar uma apresentação de trabalho — explica o neurologista André Felício, membro da Academia Brasileira de Neurologia.

Estudos pela frente

O avanço nas pesquisas em adultos portadores de TDAH tem trazido à tona a importância de um correto e preciso diagnóstico sobre a doença depois da infância, já que os tratamentos disponíveis trazem resultados quase imediatos quando o assunto é melhorar a qualidade de vida. Uma das últimas novidades na área foi a atualização dos critérios de diagnóstico, modificados para a mais recente edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) — publicação da Associação Americana de Psiquiatria adotada como principal guia internacional para a determinação das doenças mentais. Nesta atualização, de 2013, houve uma redução em relação à quantidade de sintomas necessários para o diagnóstico em adultos, já que eles tendem a atenuar alguns dos traços comportamentais.

— Manifestações de hiperatividade, como correr, escalar móveis e outros sintomas característicos de crianças, não são necessários para identificar o transtorno em adultos, por exemplo. Eles sofrem mais da sensação de inquietude, como não conseguir relaxar em momentos de descanso — explica o psiquiatra Paulo Mattos.

Além disso, a idade limite para o início da manifestação dos sintomas também foi alterada. Antigamente, eles deveriam aparecer até os sete anos. Hoje, este limite foi estendido para os 12 anos já que, segundo o especialista, muitos adultos portadores da doença têm dificuldade de se lembrar dos comportamentos atípicos antes dos sete anos.

Os tratamentos realizados hoje para pacientes portadores do transtorno, tanto adultos quanto crianças, são baseados em medicamentos psicoestimulantes, como a ritalina e a anfetamina. O psiquiatra Eugenio Grevet explica que, apesar de não ter cura, o TDAH é uma doença que ainda precisa de muitos estudos, pois em torno de 15% dos pacientes que realizam um tratamento contínuo por cerca de sete anos param de apresentar os sintomas mesmo depois de deixar de tomar o medicamento.

Para Cleber Ferrari, o tratamento de dois anos com medicamentos e acompanhamento de especialistas significou uma mudança radical em sua vida. Sentindo-se mais "enquadrado" na sociedade, ele adquiriu a confiança para ingressar em cursos de pós-graduação e, principalmente, de estudar para um concurso, do qual já foi aprovado.

— Ninguém enxergava o que eu tinha como um transtorno, mas depois que realizei as avaliações e fui diagnosticado, vi que muitas coisas na minha vida faziam sentido. Hoje sei que o tenho e que preciso tratá-lo da forma adequada — resume Cleber.


Autor: Jaqueline Sordi
Fonte: Zero Hora
Autor da Foto: Marcelo Oliveira

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