.
 
 
O cardápio do prazer
 
Notícias
 
     
   

Tamanho da fonte:


23/09/2009

O cardápio do prazer

A ciência começa a decifrar como os alimentos podem tornar sua vida sexual mais feliz e até aumentar a fertilidade

A combinação de sexo e alimentos sempre fez parte das fantasias da humanidade. Conhecida como a fruta do pecado, a maçã, por exemplo, é o símbolo da tentação. Vermelha e suculenta, está associada ao triunfo dos impulsos, ao desejo, à sensualidade. Portanto, é afrodisíaca. Uma fama que atravessou séculos. Ostras e pimentas também compõem a lista de alimentos aos quais se atribui o poder de melhorar a vida sexual. E, se até agora suas qualidades estimulantes eram tidas como folclore por muita gente, seus efeitos começam a ser vistos com outros olhos pela ciência e estudados com mais rigor. Um dos motivos para esse interesse é o reconhecimento, pela Organização Mundial de Saúde, de que a atividade sexual satisfatória é um dos pilares da boa qualidade de vida. Por isso, vale a pena procurar tudo o que possa contribuir para que isso se torne uma realidade cada vez mais acessível a todos. É um esforço que está produzindo novas informações sobre o papel dos nutrientes para enriquecer cada etapa - da atração ao orgasmo, do desejo ao aumento da fertilidade. E, aos poucos, faz surgir o que se pode chamar de dieta da sexualidade.

A última contribuição para esse cardápio do prazer foi dada por pesquisadores da Smell and Taste Treatment and Research Foundation (EUA). Liderados pelo neurologista e psiquiatra Alan Hirsch, os cientistas descobriram qualidades valiosas para a sexualidade masculina em alimentos jamais considerados afrodisíacos, como pipoca na manteiga, rosquinhas, laranja e clássicos da cozinha americana, como a torta de abóbora temperada com canela e gengibre. "Esses alimentos melhoram a irrigação sanguínea na região peniana", explicou Hirsch à ISTOÉ.

Trata-se de um efeito que beneficia os mecanismos de ereção e sua manutenção. No trabalho, 31 homens foram submetidos à inalação de 30 tipos de aromas e tiveram as variações na circulação genital medida por aparelhos. Há várias hipóteses para explicar a reação. "Os odores podem, por exemplo, reduzir a ansiedade ou agir diretamente sobre os centros cerebrais associados à ereção", disse o pesquisador. O próximo passo é avaliar como esses cheiros podem ser usados no tratamento de alterações das respostas sexuais.

Na verdade, a associação entre sexo e comida é antiquíssima - os gregos antigos usavam mel, considerado por eles o néctar do amor. Mas o que acontece agora é que o ser humano está descobrindo como cada ingrediente atua na saúde sexual e reprodutiva. "Sabemos que existem nutrientes importantes para a saúde do cérebro, o mais erógeno dos nossos órgãos. Um deles é o DHA, presente em algas", disse à ISTOÉ o médico Michael Roizen, da Cleveland Clinic (EUA), e autor de best-sellers como "A Idade Verdadeira". "E há também substâncias essenciais para a boa irrigação sanguínea dos órgãos sexuais. Portanto, falar hoje sobre a performance sexual é falar sobre a saúde e nutrição global do corpo."

Há dados vindo à luz que ajudam a incrementar a dieta em cada etapa da relação sexual. A primeira é o desejo. Está comprovado que o zinco, disponível nas ostras e em amêndoas, por exemplo, desempenha papel importante para despertá-lo. "Ele auxilia na fabricação da testosterona, o hormônio sexual masculino", explica a nutricionista Christiane Castro, autora do livro "Alimentação e Sexo - Realidade e Mitos sobre os Afrodisíacos". Além de ser o responsável pelas características masculinas, o hormônio está por trás da

libido, tanto do homem quanto da mulher. Se estiver em baixa, a vontade para o sexo ficará enfraquecida. O bom é que, além do zinco, há vários outros nutrientes que elevam os níveis do hormônio. "As fibras solúveis, presentes na aveia, entre outros alimentos, também fazem isso", explica Daniela Jobst, da clínica NutriJobst, em São Paulo. Mais uma boa opção é o chocolate. O doce, sempre presente no menu romântico, aumenta os níveis de substâncias cerebrais associadas ao prazer. Isso amplia o desejo. Um estudo italiano, publicado na revista científica "The Journal of Sexual Medicine", da Sociedade Internacional de Medicina Sexual, comprovou esses mecanismos. Numa investigação com 163 mulheres, os cientistas concluíram que aquelas que ingeriram uma porção da guloseima por dia no período estudado tiveram elevado o desejo sexual. O mesmo não aconteceu com as voluntárias que não a consumiram.

Na etapa seguinte, a da facilitação do orgasmo, os nutrientes que aparecem com maior relevância são os que estimulam a fabricação do óxido nítrico, substância que ajuda a relaxar as paredes dos vasos sanguíneos. O processo é fundamental para que o pênis se encha de sangue no momento da relação, numa preparação vital para o clímax. "Os polifenóis, por exemplo, encontrados no chá verde, aumentam a síntese desse composto", explica a nutricionista e farmacêutica Lucyanna Kalluf, do Instituto Alpha de Saúde Integral, de São Paulo. Para a mulher, a capsaicina, típica das pimentas, relaxa os músculos da região da vagina, facilitando a penetração do pênis e o orgasmo.

Muito conhecimento está sendo gerado também sobre a associação entre os alimentos e a fertilidade. Dois novos estudos feitos nas universidades de Murcia e de Alicante, na Espanha, revelam que o vínculo é muito maior do que se imagina. O primeiro, publicado na edição online da revista científica "Fertility and Sterility", mostrou que o baixo consumo de antioxidantes, substâncias encontradas principalmente em frutas, está ligado à queda da capacidade reprodutiva nos homens. A falta desses compostos deixa livre o caminho para o ataque dos radicais livres, moléculas que prejudicam a qualidade do sêmen. O outro trabalho provou que as carnes muito gordurosas e os produtos lácteos reduzem a quantidade de espermatozoides no sêmen e prejudicam sua capacidade de chegar ao óvulo. "A conclusão é que uma dieta saudável melhora a qualidade do líquido seminal", afirma Jaime Mendiola, da Universidade de Murcia.

O assunto igualmente é linha de pesquisa na Universidade de Harvard, nos EUA. Os cientistas Jorge Chavarro e Walter Willet, ambos da instituição, avaliaram os impactos da dieta na fertilidade de 18 mil mulheres. Ao final do estudo, que durou oito anos, uma em cada seis participantes apresentou dificuldades para engravidar. Entre os nutrientes prejudiciais identificados na pesquisa estavam os carboidratos de fácil digestão. Presentes no pão branco e batatas, por exemplo, eles podem interferir na ovulação por um mecanismo complexo que envolve o controle dos níveis de insulina, o hormônio que abre a porta das células para a entrada da glicose que está circulando no sangue. "Essa alteração pode levar a um desequilíbrio dos hormônios envolvidos na reprodução", escreveu o pesquisador Chavarro. "É o contrário dos alimentos integrais, ricos em carboidratos de lenta digestão, relacionados com maior chance de gravidez."

Outro ponto em discussão é a relação entre peso e fertilidade. Na avaliação do médico Marcio Coslovsky, da Clínica Huntington, do Rio de Janeiro, mulheres muito magras ou acima do peso podem apresentar problemas para engravidar.

"No primeiro caso, a falta de gordura prejudica a produção do estrogênio, o hormônio sexual feminino", explica o médico. "Já o excesso de peso altera a sensibilidade das células à insulina e pode interferir na fertilidade." Com base em evidências como essas, especialistas em reprodução humana assistida já incluem na conduta de tratamento a questão nutricional. "Nossos pacientes são orientados, por exemplo, a incluir alimentos com substâncias antioxidantes", diz o médico Edson Borges, da Clínica Fertility, em São Paulo.

Estas são revelações sobre os mecanismos de ação dos nutrientes dentro do organismo que contribuem para levar à satisfação sexual e garantir a fertilidade. Mas há um aspecto especialmente interessante sobre a ligação da comida com o sexo que foge às explicações fisiológicas e repousa mais nas nossas memórias, sentidos e sentimentos. Em primeiro lugar, é consenso que de nada adianta consumir os alimentos certos se isso não for acompanhado de uma atmosfera atraente. Uma mesa bem colocada, um vinho delicioso, pratos com uma bela apresentação e uma luz aconchegante fazem muita diferença para que o clima comece bem. "O sexo é um jogo que precisa de estímulos para ser mais intenso. A comida pode ter essa finalidade", diz a ginecologista e terapeuta sexual Tânia das Graças Santana, coordenadora do Centro de Referência e Especialização em Sexologia do Hospital Pérola Byington, em São Paulo. "Assim, um jantar a dois com comidas bonitas pode ser entendido como uma espécie de fantasia sexual", afirma a terapeuta.

Os alimentos também têm o papel de estimular fortemente os sentidos - tato, paladar, olfato, visão e, por que não, até o som produzido ao morder algumas frutas ou o barulhinho do champanhe caindo na taça (ou no corpo) podem ser excitantes. Aromas, texturas, formas sempre foram gatilhos para a atração. Por quê? Bem, as explicações para isso têm vários níveis de profundidade, na opinião do ginecologista Eliano Pellini, chefe do setor de Saúde e Medicina Sexual da Faculdade de Medicina do ABC, em São Paulo.

No primeiro patamar, por assim dizer, existe uma associação imediata das formas dos alimentos com a anatomia humana.

"O formato arredondado dos pêssegos e sua cor remetem, no imaginário, a seios túmidos", diz Pellini. Depois, num nível mais profundo do imaginário coletivo, surgem evocações que unem as formas às informações da mitologia. A maçã, por exemplo, cortada ao meio, sugere uma visão dos genitais femininos. Mas também, como se sabe, a fruta aparece em lendas envolvendo disputas amorosas e sedução. "Já as romãs, com seu interior vermelho, remetem à menstruação e suas sementes, comidas no Ano- Novo, à fertilidade", diz Pellini.

A associação de espuma ao prazer também tem sua origem na mitologia. Ela está relacionada ao mito do nascimento de Afrodite, a deusa grega da beleza e do amor, chamada de Vênus pelos romanos. A história conta que ela ergueu-se das espumas do mar depois que testículos do deus Urano foram atirados às águas, fecundando-as. Muitos séculos depois, precisamente no século XV, Sandro Botticelli pintou "O Nascimento de Vênus", um dos quadros mais famosos da humanidade. A pintura representa uma mulher adulta emergindo do mar, sobre uma concha, símbolo associado, na antiguidade, à vagina.

A história ajuda a explicar ainda porque outros alimentos passaram a ser considerados afrodisíacos. Dizia-se que o sal teria esses poderes. "Era algo tão raro há dois mil anos que consumi-lo produzia excitação", diz o psicólogo e terapeuta sexual Oswaldo Rodrigues, do Instituto Paulista de Sexualidade. O mesmo critério - a escassez - está na origem do mito que atribui qualidades estimulantes à genitália de animais. "Além disso, eles são mais proteicos. E, como o sexo precisa de energia, a ideia de se alimentar com essas partes para recuperar as forças e a libido ganhou força especialmente em épocas de falta de alimentos", diz o terapeuta. Dessa lista de iguarias fazem parte os testículos de tigres asiáticos e a vulva do boto fêmea e o pênis do macho. "No mercado de Belém, os genitais de botos e do quati são vendidos com finalidade afrodisíaca", diz Rodrigues. Na África, um dos principais alvos é o consumo do pó feito a partir de chifre do rinoceronte - parte similar ao formato do pênis. Para preservar essa espécie, é uma política de parques africanos cerrar preventivamente os chifres desses animais. Felizmente, pelas descobertas da ciência, a boa notícia é que não é mais necessário mutilar animais para transar com mais apetite. O mesmo efeito pode ser obtido com alimentos charmosos, como frutos do mar, uvas e chocolates. Tudo temperado, é claro, por boa dose de imaginação.
 


Autor: Cilene Pereira, Greice Rodrigues e Mônica Tarantino
Fonte: Isto É

Imprimir Enviar link

Solicite aqui um artigo ou algum assunto de seu interesse!

Confira Também as Últimas Notícias abaixo!

 
 
 
 
 
 
 
Facebook
 
     
 
 
 
 
 
Newsletter
 
     
 
Cadastre seu email.
 
 
 
 
Interatividade
 
     
 

                         

 
 
.

SIS.SAÚDE - Sistema de Informação em Saúde - Brasil
O SIS.Saúde tem o propósito de prestar informações em saúde, não é um hospital ou clínica.
Não atendemos pacientes e não fornecemos tratamentos.
Administração do site e-mail: mappel@sissaude.com.br. (51) 2160-6581