O estudo realizado por Fridell et al. (2008) apresentou uma nova abordagem para a avaliação da relação do uso de drogas e o crime na medida em que propôs avaliar os abusadores de drogas em relação à prevalência de transtorno de personalidade antissocial. O transtorno de personalidade antissocial pode ser caracterizado como um padrão permanente de comportamento de desrespeito e violação aos direitos e sentimentos dos outros (DSM-IV - Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 1995) e apresenta um prognóstico reservado de tratamento.
No estudo citado, foram avaliadas 1.052 pessoas admitidas entre 1977 e 1995 em um programa de desintoxicação para drogas em curto prazo. Com a justiça criminal, foram levantados dados relativos a crimes realizados desde o momento da internação até o ano de 2004 ou até o óbito dessas pessoas. Os resultados do estudo revelaram que 90% das pessoas avaliadas obtiveram um registro de crime pelo menos uma vez na vida. Os homens obtiveram mais registros de crimes que as mulheres, bem como os mais jovens comparativamente aos mais velhos.
As drogas estimulantes (principalmente a anfetamina) foram associadas com a prevalência de variados tipos de crimes. Os opiáceos (especialmente a heroína) foram relacionados ao roubo e à fraude. Os usuários de maconha apresentaram uma tendência menor para o crime. Segundo os pesquisadores, esses aspectos podem ser explicados pelo fato dos estimulantes causarem um julgamento com prejuízos, impulsividade e agressividade. Já os usuários de opiáceos podem ter sido levados a atos criminosos para conseguirem a droga.
Contudo, as pessoas diagnosticadas como transtorno de personalidade antissocial apresentaram uma tendência de realizarem 2,16 vezes mais roubos, como também 2,44 vezes mais crimes múltiplos ao longo da observação. Tais pessoas apresentaram uma tendência maior de cometerem uma multiplicidade de crimes ao longo do tempo que as que não apresentavam tal transtorno.
Assim, as conclusões principais do estudo foram que as pessoas abusadoras de drogas tendem a cometer crimes. Porém, as que apresentam transtorno de personalidade antissocial e são abusadoras de drogas tendem a apresentar uma criminalidade mais severa e sistemática ao longo do tempo.
Observamos que o diagnóstico de transtorno de personalidade antissocial é complexo, necessitando de instrumentos válidos e pessoas capacitadas para tanto, além de existir a questão controversa do diagnostico de uma pessoa em determinada categoria de personalidade. Contudo, o estudo abordado sugere que o tratamento do abuso de drogas deve considerar cada caso especifico, incluindo a avaliação dos transtornos de personalidade; bem como a prevenção e o tratamento podem ser aliados importantes para a diminuição das taxas de crimes. Assim, o crime por abuso de substâncias não deve ser tratado por uma esfera única, é um assunto de segurança, de saúde pública e, quem sabe, deva incluir também a esfera judiciária no repensar essa questão.
Referências
DSM-IV - Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
Fridell, M. et al. Antisocial personality disorder as a predictor of criminal behaviour in a longitudinal study of a cohort of abusers of several classes of drugs: Relation to type of substance and type of crime. Addictive Behaviors, v. 33, n. 6, p. 799-811, jun. 2008.