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Grupos de ajuda contribuem para aliviar o pesado fardo de familiares e amigos de dependentes químico
 
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13/07/2010

Grupos de ajuda contribuem para aliviar o pesado fardo de familiares e amigos de dependentes químico

A chamada codependência provoca sintomas semelhantes aos dos próprios viciados em álcool ou drogas

Eles vivem em função do vício. Perdem os amigos, não conseguem permanecer no emprego, têm surtos nervosos, gritam muito, sofrem de baixa autoestima. Essas características, que poderiam ser de qualquer dependente de álcool ou de drogas, é na verdade de pessoas que nunca beberam ou usaram qualquer substância ilícita. Trata-se da codependência, problema que deixa familiares e amigos de dependentes químicos no limite entre a culpa, a raiva, a compaixão e a autopiedade.

Pouco conhecido e carente de estatísticas oficiais, estima-se que o problema atinja, em diferentes níveis, cerca de 50 milhões de brasileiros — ou seja, para cada dependente químico, há pelo menos mais cinco codependentes. Os reflexos, que começam a aparecer aos poucos, são tão graves quanto os da dependência em si.

“Meus filhos me diziam que eu parecia uma louca, que gritava o tempo todo. Eu só tinha cabeça para o alcoolismo do meu marido. Era tão focada nisso que me esquecia do resto.” Esse é o depoimento de Tereza*, casada com um alcoólatra há 30 anos. “Com o tempo, comecei a perceber que eu estava começando a agir como ele, não tinha paciência com meus filhos, estava sempre estressada”, relembra. “Eu cheguei ao ponto de não me lembrar das coisas importantes. Tinha que equilibrar tantas funções dentro de casa que acabei deixando eles de lado muitas vezes”, relembra.

A vida da dona de casa só voltou para os eixos quando ela viu que tinha um problema e que precisava de tratamento. “Naquele tempo eu nem sabia o que era codependência, mas uma amiga comentou comigo que existiam grupos de ajuda e eu comecei a procurar”, relembra. Depois de alguns meses, ela conheceu o Al-Anon, grupo semelhante ao AA (ambas as siglas significam Alcoólicos Anônimos), que ajuda famílias e amigos de dependentes químicos a lidarem melhor com o problema. Nas reuniões, uma vez por semana, ela não encontrou conselhos ou soluções. No anonimato exigido pelo grupo, porém, Tereza descobriu um espaço para compartilhar experiências e desabafar, além de ter acesso à vasta literatura sobre o tema.

Mal progressivo

Assim como a dependência, a codependência também é um mal progressivo, que demora anos para aparecer. “Começa aos poucos, você demora muito tempo para perceber e, quando isso acontece, você já sofreu muito”, conta Tereza. “Muitas vezes, a família sofre mais do que o dependente. Eles vivem em um mundo à parte, com valores e pensamentos diferentes, e somos nós que ficamos aqui no mundo real resolvendo os problemas, nos justificando com as pessoas”, afirma. Para ela, os que mais sofrem são os filhos. “Existe ex-marido, ex-amigo, mas não existe ex-filho. A gente pode se afastar, mas as crianças não. Elas não têm escolha”, opina.

Depois de ingressar no grupo, a mentalidade de Tereza mudou completamente. “Descobri que, para ajudar meu marido, eu precisava me ajudar, precisava estar bem. Com a responsabilidade de carregar sozinha a minha família, acabei me esquecendo de mim, que também mereço ser feliz, independentemente do problema dele”, afirma. Há 15 anos participando de reuniões semanais, ela descobriu uma nova forma de viver. “Isso se torna um estilo de vida. Me tornei mais centrada e equilibrada e assim pude ajudar meu marido, justamente na hora certa, ou seja, quando ele quis ser ajudado.”

Um dos primeiros ensinamentos para quem chega ao Al-Anon é o de que não se pode ser facilitador do vício. “Muitas vezes, a gente liga no trabalho para justificar as ausências por causa do álcool ou, quando ele chega em casa e bagunça as coisas, nós arrumamos”, conta Maria*, que também é codependente. Esse tipo de atitude faz com que os dependentes não tenham noção dos seus atos. “Quando meu marido chegava bêbado e caía na sala, eu o arrastava para o quarto. Quando ele acordava, nem se lembrava do estado em que estava quando chegou em casa”, conta. “Hoje é diferente, se ele faz isso, eu boto um cobertor e o deixo lá. Isso o ajuda a perceber o que está acontecendo”, diz.

Por mais duro que possa parecer, foi esse tipo de atitude que ajudou o marido de Tereza. “Há 10 anos ele não bebe mais, e foi justamente quando ele percebeu que eu estava me reerguendo e deixando de viver em função dele que ele decidiu procurar ajuda”, conta. Já no caso de Maria, a situação é um pouco diferente. “Depois que eu comecei a me ajudar, a situação melhorou muito, acabaram as brigas constantes e o clima da casa ficou mais tranquilo, mas meu marido ainda bebe”, conta. “Como é um problema que demora anos para ser percebido, a cura também é demorada, mas aos poucos as coisas vão melhorando”, comenta.

Rede pública

Além do Al-Anon, o sistema público de saúde do Distrito Federal também oferece apoio para os codependentes. Segundo a gerente do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) do Guará, Sônia Mochiutti, quando um dependente químico procura atendimento, ele é orientado a trazer um parente, que também recebe orientações. “Esse familiar vai ser orientado que a dependência é uma doença que precisa tratada, e então poderá auxiliar no tratamento quando o paciente estiver em casa”, conta.

Além de ajudar na recuperação, familiares e amigos recebem apoio para reconstruir suas vidas. “Nos Caps, também existem grupos terapêuticos, coordenados por um psicólogo. Nos casos em que a família estiver em situação mais grave, ela é encaminhada para psicólogos para atendimento individualizado em unidades parceiras, como universidades”, conta Sônia. “Mesmo que o dependente não queira buscar tratamento ou não esteja se tratando na rede pública, qualquer pessoa pode buscar os grupos, que ajudarão a enfrentar esse problema.”

Para a professora titular do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB) e do Programa de Estudo e Atenção às Dependências Químicas (Prodequi), Maria Fátima Sudback, a dependência deve ser vista como um problema familiar, e não de um indivíduo isolado. “Em geral, o dependente é apenas uma pessoa mais sensível que acaba ficando doente, e não um culpado ou uma pessoa que traz sofrimento para os familiares”, explica.

Segundo Maria Fátima, cuidar também das pessoas próximas é uma forma de combater o problema de maneira mais ampla. “Não estamos responsabilizando a família, e sim reconhecendo a sua importância, tanto para a vida do paciente quanto para o sucesso do tratamento. Afinal, são essas pessoas que vão lidar mais diretamente com o dependente”, afirma a psicóloga. “Em geral, o dependente não reconhece o problema, e é através da ação familiar que ele conseguirá resolvê-lo.”

*Nomes fictícios a pedido dos entrevistados

Onde procurar ajuda

Centro de Atendimento Psicossocial (Caps)
3369-9933 / 3369-9934

Al-Anon
3273-0404


Autor: Redação
Fonte: Correio Braziliense

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