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Saiba por que as mulheres são as maiores vítimas dessa que é a mais terrível das dores de cabeça e como prevenir o aparecimento de novas crises

Para cada homem com dores atrozes na cabeça, há 2,2 mulheres afetadas pela enxaqueca, a mais terrível de todas elas. A enxaqueca é, na verdade, uma doença neurológica crônica com causas variadas e predisposição genética. "É muito comum, durante a primeira consulta com o paciente, descobrir que ele possui algum parente de 1.° grau com a mesma doença", confirma Getúlio Daré Ribeiro, coordenador do Ambulatório de Cefaleia do Hospital das Clínicas de São Paulo.

O médico ainda alerta para o fato de que, aproximadamente, 20% da população feminina sofra suas consequências. Entre os homens, a porcentagem varia entre 5% e 10%. O problema, geralmente, se inicia na infância ou na adolescência e pode acompanhar a pessoa por toda a vida. Na prática, ela se traduz por uma dor unilateral, latejante, e piora com a movimentação, o que obriga muitas vezes a pessoa a recolher-se num quarto escuro por causa da hipersensibilidade à luz e aos ruídos.

O incômodo pode durar entre quatro e 72 horas. Causa sensação de dormência em membros do corpo, náusea e perturbações visuais, como luzes piscando e visão embaçada. Enfim, um tormento, mas hoje cada vez melhor controlado, especialmente para aqueles que aceitam que não basta entupirse de medicamentos para aliviar a dor.

Dores que pioram à mesa

Os maiores vilões da enxaqueca são três: jejum prolongado, bebida alcoólica e consumo excessivo de café, segundo o especialista Mario Peres. Tomar muito refrigerante diet (com aspartame) e temperar a comida com glutamato monossódico (mais conhecido por seu nome comercial aji-no-moto) são outros hábitos proibitivos por serem conhecidos como gatilhos para as dores. Estima-se que quatro ou cinco cafezinhos contenham 200 mg de cafeína, o limite máximo permitido. O problema é o hábito disseminado nos escritórios e repartições de tomar várias xícaras ao longo do dia. A soma dessas pequenas doses gera propensão maior para dor de cabeça, irritabilidade, insônia, tremor nas mãos, ansiedade. Por isso, é importante vigiar o consumo de café.

HORMÔNIOS E ATITUDES

O primeiro estudo epidemiológico que mapeou a enxaqueca no Brasil, por amostra populacional, indicou que o Sudeste é campeão nesse quesito, com índices que chegam a 20,5% de toda a população, seguido pela região Sul, com 16,4%, e Centro-Oeste, 9,5%. As mulheres são as vítimas mais frequentes não apenas por maior predisposição genética e porque a dança mensal de hormônios favorece a doença. Há também o fator comportamental, que se traduz em mais ansiedade, oscilação de humor, irritabilidade como causas principais.

"A flutuação hormonal é a grande responsável, especialmente com a queda nos níveis de estrógeno, que deixa a mulher mais predisposta às crises. A alteração de neurotransmissores, como a serotonina, é outro motivo que explica as alterações comportamentais", afirma o coordenador do mapeamento inédito, Mario Peres, professor do departamento de Neurologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e médico do Hospital Israelita Albert Einstein.

De acordo com os resultados de um estudo publicado em março na revista Headache, a associação entre menstruação e enxaqueca pode ser demonstrada já durante a adolescência. Os pesquisadores do Children's Hospital Medical Center avaliaram 896 meninas com idade entre nove e 18 anos.

Desse total, 331 relataram o aparecimento de dor de cabeça durante o período menstrual. Além disso, 160 meninas determinaram um padrão mensal para as dores, apesar de não terem apresentado menarca. "Esses dados sugerem que a enxaqueca relacionada à menstruação aparece antes do primeiro ciclo menstrual, o que indica ser um evento sensível às flutuações hormonais que podem aparecer antes da menarca", disse Andrew Hershey, chefe do estudo.

A serotonina liberada durante a prática de exercícios físicos é capaz de reduzir a inflamação e a dilatação dos vasos sanguíneos cerebrais. Em consequência, tende a desacelerar a dor de cabeça

Sintomas clássicos

Vários pacientes convivem também com as chamadas auras, que aparecem antes dos episódios de enxaqueca. As mais comuns afetam a visão e incluem o aparecimento, diante dos olhos, de pontos e linhas brilhantes. Duram de minutos a horas e marcam o início da crise, cujos sintomas são:
* Dor de cabeça latejante;
* Intolerância a luzes, ruídos e cheiros;
* Náuseas;
* Vômitos;
* Piora diante de movimentos bruscos, inclinação da cabeça, atividade física e esforço mental;
* Sensação de esgotamento ao fim da crise.

FATOR CHOCOLATE

Um problema de saúde ainda sem cura, a enxaqueca pode ser amenizada e as crises, evitadas com pequenas medidas. Os especialistas dão preciosas dicas de como conviver com ela. Uma delas é fazer um diário detalhado, incluindo os dias de dor, a intensidade e as datas do ciclo menstrual. Esse relato pode ajudar a estabelecer uma relação entre a dor e as fases do ciclo. Também é importante sabe quais alimentos pioram o problema. "Cada pessoa sabe quais alimentos lhe fazem mal e devem ser evitados.

Não tem sentido restringir a dieta a não ser que a pessoa reconheça a ligação existente entre a enxaqueca e determinado ingrediente", diz Mario Peres, que lançou em 2008 o livro Dor de cabeça - o que ela quer com você? (Integrare Editora). O chocolate costuma ser equivocadamente citado como gatilho da enxaqueca. Na verdade, explica Peres, entre os sinais prévios de que uma crise está a caminho estão o incômodo com a luz, bocejos e vontade de comer chocolate. "Ele contém cafeína, mas estudos mostram que, se for consumido com moderação, não é um fator de risco importante", absolve.

DESACELERE A DOR

Exercícios físicos, medidas de relaxamento, psicoterapia, livrar-se de males como o tabagismo e do consumo excessivo de cafeína, álcool e dos excessos alimentares podem ser decisivos para o sucesso do tratamento, listam Mario Peres e Getúlio Daré.

A atividade física libera endorfina e serotonina, substâncias que trazem bem-estar e auxiliam no combate à dor. A serotonina, em particular, é descrita na literatura médica como capaz de reduzir a inflamação e a dilatação dos vasos sanguíneos cerebrais. Em consequência, tende a desacelerar a dor. Mas, durante uma crise, nem pense em se exercitar. Dê um repouso ao seu corpo e somente retome as atividades quando estiver bem, alertam os médicos.

O lado psíquico e emocional também é um fator que não pode ser desprezado. Se a pessoa exige muito de si própria, pode beneficiar-se recorrendo à psicoterapia e a técnicas como ioga e meditação, que costumam funcionar bem. Caso haja envolvimento de um componente da musculatura cervical, a fisioterapia é um recurso com bons resultados.

O uso excessivo de analgésicos, mais que duas vezes por semana, pode transformar uma cefaleia episódica em crônica

QUAL É O TRATAMENTO?

Há várias classes de medicamentos que podem ser usadas, mas antes de indicá-las é indispensável o médico fazer o diagnóstico correto e o paciente entender por que a dor existe no organismo. "Ela é um sinal de alerta do sistema de defesa com a função específica de readquirir o equilíbrio interno. Avaliar o que está acontecendo com aquela pessoa pode ajudar bastante no controle das crises. Só então indica-se o tratamento preventivo, que pode ser medicamentoso e o que muda hábitos de vida. Em muitos casos, eles estão associados para evitar que a dor apareça", explica Peres. É importante evitar o uso excessivo de analgésicos.

Em vez de amenizar a dor, como esperado, quando consumidos em excesso podem agravar o problema. "Estudos mostram que o abuso desses medicamentos interfere no número de crises de dores de cabeça e induz à evolução para a dor crônica", alerta a psiquiatra Esther Angélica Coelho Costa. Há pouco mais de um ano, ela concluiu um levantamento com pacientes atendidos pelo Ambulatório de Cefaleias da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em que não foi possível definir o que vem primeiro: o consumo exagerado de analgésicos ou o agravamento da dor.

O uso excessivo desses remédios, mais que duas vezes por semana, pode causar "cefaléia-rebote" e transformar uma dor episódica em crônica, como reforça a pesquisadora. "O ideal é usar os recursos preventivos, seja com medicamentos prescritos e hábitos de vida mais salutares, para evitar que as crises apareçam", indica Mario Peres.

A frequência das crises é o parâmetro médico para indicação do melhor tratamento. Quatro por mês é o limite máximo para iniciar a prevenção. Crises com um intervalo maior, mas muito intensas, também exigem cuidados.

Além dos antidepressivos e anticonvulsivantes utilizados no controle da enxaqueca, não faltam estudos sugerindo alternativas terapêuticas. Segundo Peres, até mesmo a toxina botulínica já foi utilizada, mas existem dúvidas sobre os riscos associados.


Autor: Stella Galvão
Fonte: Viva Saúde

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